sábado, 26 de abril de 2008

9.0 Richter

Terça-feira foi um dia normal. Trabalhei, estudei e fui para a faculdade à noite. Lá encontrei amigos...comemos, bebemos e conversamos animadamente. Normal.

Daí eu volto para a sala e alguém pergunta: "Teve terremoto?" Diante do nonsense da pergunta, minha única reação foi rir e voltar aos meus afazeres. Só quando eu cheguei em casa que soube, surpreso, que efetivamente houve um tremor de terra horas antes.

Que coisa. Meros cinco segundos (acho que foi isso) de tremor, que muita gente nem sentiu, e foi o bastante para horas e horas de sensacionalismo barato na tevê. Obviamente que eu perdi algum tempo pensando a respeito, como não poderia deixar de ser... Por que tanto se falou nisso?

Eu tenho uma teoria. Uma teoria que tem a ver com as pessoas ao meu redor (boa parte delas, pelo menos) e comigo mesmo.

As pessoas buscam segurança. Buscam por certezas na vida. É realmente desesperador imaginar que o chão, aquilo que temos como mais firme nesse mundo - pelo menos no Brasil - de repente não nos oferece mais a segurança a que estamos acostumados. Isso só me faz crer, cada vez mais, que segurança é ilusão.

É ilusão no sentido de que é só mais uma sensação da nossa mente, que se fecha à realidade que insiste em tentar em nos mostrar que, bem ou mal, tudo acaba.

Na faculdade nos falam sobre a segurança que o direito oferece à sociedade. Engraçado como essa idéia resiste a todas as revoluções.

Tratamos de construir algo com as pessoas ao nosso redor. É-nos abominável a idéia de morrer no abandono...é menos penoso imaginar-se no leito de morte velhinho, rodeado de entes queridos, talvez. Mas sempre nos esquecemos de que, no instante em que a última centelha que nos anima se extinguir, estaremos invariavelmente sós.

Vejo algumas pessoas passando por situações pouco agradáveis. Algumas confiam numa Providência que vai dar um jeito em tudo. Outras são otimistas, apenas. Há ainda os que se entregaram à inércia do conformismo ou ao niilismo. Daqueles que, por outro lado, tentam mudar o que acham que não está bom em suas vidas, alguns obtêm êxito. Seja porque conseguiram aquilo que queriam, seja porque isso serviu para operar uma mudança em si mesmos.

A vida neste mundo é mudança. Mesmo nossas escolhas envolvem riscos, e tentamos nos cercar de todas as garantias quando temos que escolher um caminho. Isso não é escolha! Escolher nunca deixará de implicar perda... pelo menos daquilo que se deixou de escolher. Outro dia me disseram (manifeste-se nos comentários quem o fez, não se deixe impedir pela modéstia) que para nascer é necessário romper justamente com aquilo que nos mantém vivos! E isso de fato é lindo porque ironicamente ou não, intencionalmente ou não, dramaticamente ou não, isso é a síntese de tudo o que nos aguarda.

Outra coisa que me disseram: a vida não é uma sucessão de fases intercaladas por provações: escola - vestibular - trabalho... É uma continuidade de contingências determinadas por escolhas que quase nunca estamos em posição privilegiada o bastante para analisar com cuidado.

Não quis fazer auto-ajuda. Não quis fazer desabafo. Mas eu tinha que fazer essas observações antes de ir dormir.

sábado, 5 de abril de 2008

Do tributo ao atributo

Prova de Direito Tributário na segunda. O monitor da matéria enviou seis provas diferentes por e-mail, sendo que uma delas é a "oficial", aquela que a gente vai receber na hora. Com isso eu já fiquei meio p... da vida porque na prática isso significa ter que resolver seis provas. Depois a raiva passou, juntei-me a algumas pessoas e dividimos o bolo. Pensando bem, até que isso tudo não é de todo mau, pelo menos na hora da prova não corro o risco de me deparar com algo que eu não estudei.

Aí, quando eu já estou conformado, abro o arquivo das provas. Vem lá um caso prático e em seguida alguns itens para responder. Aparentemente nada muito desafiador.

O primeiro ponto pedia para determinar os principais institutos jurídicos envolvidos no caso. Daí comecei a refletir sobre o que diabos eu deveria entender por "instituto jurídico" e comecei a viajar. Vai vendo.

É engraçado pensar sobre o significado das palavras, porque parece que a gente chega, em última instância, num grande vazio. A título de exemplo, um exercício metalinguístico: o verbete "dicionário" provavelmente nos remeterá a "livro" e este, por sua vez, a "obra", que me remeteu a "trabalho", e daí a "atividade", definida como "qualidade", daí passando a "atributo" e então a "ser". Resolvi fechar o dicionário nesse ponto, em que a pesquisa começava a se tornar literalmente metafísica.

Ainda hoje eu estava lendo a Paidéia, livro que eu comecei a ler pelo menos uns seis meses antes de iniciar este blog (o que já faz um ano, por sinal) e ainda estou na metade. Um dia eu ainda consigo terminar a leitura. Enfim, sem divagações: lá eu estava lendo sobre Platão, mais especificamente sobre um diálogo dele em que Sócrates, desocupado-mor de Atenas (palavras minhas, até porque o Jaeger acha esses caras o máximo) estava discutindo com um sofista sobre a essência da virtude. O problema era mais ou menos o mesmo que surgiu para mim, já que Sócrates queria demonstrar que as várias qualidades que a gente reconhece como virtuosas (justiça, heroísmo, discernimento etc) não são elas próprias virtudes, senão aspectos da Virtude, que é única, justamente pelo fato de reconhecermos virtude em todas essas ações.

Claro que tudo isso só pode levar à Teoria das Idéias do Platão. Aí a coisa fica mais complicada. A teoria original, segundo Jaeger, está fundada nessa concepção de eidos, que seria exatamente o resultado desse exercício de generalização. O que ferra tudo é que Platão apela para a questão da reencarnação para explicar o porquê de reconhecermos as essências das coisas. Jaeger diz também que a Teoria das Idéias sofreu deturpação pela Lógica moderna que, apoiada em Aristóteles, afirma que em vez de resolver o problema do Ser, Platão teria complicado ainda mais, fazendo uma duplicação desnecessária do Ser.

Até que eu concordo com o Jaeger. Dá mesmo para defender que a resposta de Platão era de cunho lógico, e não ontológico; logo, ele não poderia ter pensado que os conceitos existem materialmente... até porque "conceito" nem era uma noção estabelecida à ocasião. Não que a explicação do Platão não tenha outros problemas.

Será que os sofistas, adversários de Sócrates (se ele também era um sofista, aí já é questão pra outro dia), é que estavam certos? Será que, no fim das contas, é tudo totalmente relativo mesmo? A gente sempre pensa a palavra como um instrumento, mas aí eu penso que toda ferramenta tem que ter algo por trás para poder agir. E, ao fazer essa análise, seja com os vocábulos, seja com as idéias, o único destino que eu vejo é uma regressão ad infinitum - ou talvez pior - ao vazio.

Fica aí a provocação. Voltarei a esse tema, mas não agora. Preciso continuar a responder as questões nem tão existenciais do Direito Tributário.



Nota ao rodapé:

Imagem: Platão, do verbete de mesmo nome, na Wikipedia.